sábado, 16 de abril de 2011

UM ABOIO


DISCURSO POST MORTEM DE UM JOVEM – 1ª PARTE



Agora, estou no chão com a têmpora esquerda por sobre uma porca de sangue. Vejo, ainda que desfocado, três sujeitos correndo na minha direção e dando tiros. Talvez esses sejam os meus últimos instantes de lucidez não para analisar por que estou aqui, mas para vislumbrar o último encaixe do grande quebra-cabeça que é a vida! Como iria adivinhar que eu chegaria tão longe, nessas as cartomantes e muitos menos as linhas traçadas em minhas mãos segundo a quiromancia iriam revelar o meu futuro. Pena que não fui eu que escrevi, deram-me. Aliás, nunca fui autor, conformei-me sempre com a posição de co-autor. Em toda a minha vida preferi esquivar-me, errar já não é mais humano. Não há espaço nesse mundo para os que erram. Se errares, ainda que pouco, é como perder a vez num jogo que coexiste com a vida. Ninguém sabe quando lhe darão outra oportunidade, talvez a chance de lançar outra vez os dados nesse jogo torne-se tão impossível quanto à ressurreição da carne.
Quando criança, tive pais amáveis. Uma família retilínea sem grandes causas que apontassem para um desajuste ou distúrbio. O que se aparentar ser o ideal, mas na frente transforma-se num estorvo. Não acredita? Bem, se a árvore é boa, os seus frutos idem e as suas sementes ibidem. Certo? Não. Aliás, nem sempre. Talvez essa carga de ser bom porque advém de um seio bom, por si só já se tornar um empecilho para que você seja realmente bom! Entendeu? É qualquer velha máxima: filho de peixe, peixinho é. Será? Porque as pessoas além de suas atribuições nessa vida cotidiana, ainda tenham que ostentar um rótulo em que as pessoas possam identificar a sua genética? Seja o fulano que diz se seu pai é médico então você também será médico. Não vejo lógica nisso. Ou fulano é tão ordeiro, mas o seu filho é uma praga, nem parece que são do mesmo sangue. Não entendo. Outra coisa é quando você escolhe o seu âmbito. E aí fudeu! Essa questão de escolher o que você quer é algo que permeia a sua infância, adolescência e juventude. Todo mundo pergunta: O que você vai ser? Ah, não queira isso por que isso não dá dinheiro. Não queira aquilo por que aquilo não lhe proporciona carreira. E mais importante não erre! O padre não pode trepar, trepou perdeu o sacerdócio, a vergonha, o prestígio e, como se não bastasse, ainda perdeu o reino do Céu. Ninguém mais, sobretudo os católicos o verão como um homem de Deus, mas sim como um fornicador. O nosso mundo tão tecnologicamente avançado perdeu o verbo “perdoar” em algum momento do passado. Já perceberam que as pessoas já recebem as coisas julgadas com veredito, sentença e inquestionáveis. Não há recurso, liminar ou habeas corpus para as coisas e os fatos. Prevalece o errou tá errado, ponto final.

Nenhum comentário: