quinta-feira, 14 de janeiro de 2010
BAU DO ABOIADOR - PARTE IV
“Não te escolhi por acaso para ser discípulo, tu és o único estrangeiro entre nós. Além disso, te escolhi para ser nosso tesoureiro, um cargo de confiança, mas devo dizer que para esse ato foi o próprio Deus quem o escolheu, tu serás o instrumento do Senhor, deixe que dome o seu corpo toda intervenção divina”. Deus é um gênio, o esquema estava feito. E eu acabei ficando com parte suja. No mais, o resto findará naquilo que sempre acreditei, o Cristo será imolado para que Ele sobrepuje a morte e suba ao céu, com toda a honra e glória. E eu imolarei a minha vida num jogo que já nasci perdendo. Sei que minha morte não será gloriosa. Morro à mingua, mas como? Se há um Deus onipresente. Então me suicido diante das retinas de um Deus satisfeito, pois seu plano deu certo. Sei também que Ele me olha como Simão Iscariotes. Por isso o meu sorriso em meio ao sacrifício que minha insanidade bendita me levou a cometer. A silhueta de meu corpo enforcado é deverás fascinante. Estou nu. Cabeça ligeiramente caída mirando um desfiladeiro, o tal abismo talvez seja uma metáfora de tudo que já vivi. Meu corpo esguio sente o vento delicado da Galiléia, enquanto minh´alma descarnava lentamente e dolorosamente de minhas entranhas. Mas a morte ainda burla-me, eu continuo vivo para que veja o meu próprio Gólgota. Morrerei aqui sem sepulcro, epitáfios, e epiódias. Por que me mato? Os estúpidos esquecem que somos velas acesas numa ventania incessante. A morte é a única amásia que não se afasta de nós, estamos grudados aos seus tentáculos invulneráveis. Cada dia não se vive, mas esquivar-se da morte. Hoje não tem esquive, não tem drible, não tem nada. Entrego-me na esperança de, quem sabe, libertar meu espírito dessa carne frágil, para que ela pelo menos fuja de toda cólera e ignorância humana. Mesmo depois da morte – eu sei e sinto isso – serei posto no altar-mor dos enganos e a partir daí meu nome que antes significava “Homem de Queriote” será traição e que seja feita a vontade dos tolos.
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