sexta-feira, 13 de julho de 2007

DOIS PONTOS INVERSOS - II

DISCURSO DE UM APAIXONADO


Prefiro não ver com os olhos. Olhos são traiçoeiros, completamente imprecisos. Busco o além do além que existe em cada coisa. Ponho os pés no riacho, entrego-me a incerteza de viver. Nada para mim se reduz a uma expressão algébrica, logarítmica ou exata. Tenho uma paixão desmedida pelo mistério... Bebo compulsivamente da poesia. Ah! Poesia a bebida dos rebeldes, dos impuros, das ovelhas que se perdem! Não me contento com o horizonte, quero mais. O limite é algo que não existe, não há barreiras quando suas asas são feitas de sonhos, podemos voar e transpor todas as galáxias num estalar de dedos. Quem quiser que fique com a facilidade do certo, do que concreto. Eu prefiro o risco, o constante perigo de viver... A embriaguez da ousadia... Não há nada mais tentador, mas apaixonante. Aliás, como é bom entregar-se as paixões, ao que se não entende, ao que faz borbulhar dentro do corpo inexplicavelmente. Creio que a evolução humana veio do sonho, do impossível e da poética ousadia humana de ser algo mais... Aqueles homens na caverna amedrontados com o que os olhos viam, enfunavam-se nas cavernas fugindo das peripécias naturais e dos perigos que estava reservado ali! A ilógica salvou o homem, quando as condições ao seu redor mandavam-lhe se proteger, algo dentro dele (sem explicação) mandava enfrentar.
Amo a poesia pela sua pouca clarividência, por colocar a vida como enigma e não como uma solução redonda sem decimais. A poesia bofeteia-nos com um turbilhão de interrogações, mas também mostra a plenitude das coisas simples, rudes e inatura. E aí está o enigma, enquanto se buscam as grandes coisas com estardalhaço, a natureza mostra que a simples função do micróbio regulamenta o mecanismo da vida de todos. Isso é pura poesia!

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