quinta-feira, 20 de maio de 2010

Um dedo de prosa dentro da poesia

A NOBRE ARTE DO VIVER (E DO COMER!)
Minhas manhãs têm o cheiro brasileiro
de suaves notas de cravo, erva-doce
rapadura ralada, fubá de milho e coco
cozidas no fogo à lenha
numa cumbuca preta, na forma de um bolo (*).
Minhas manhãs têm o cheiro ameríndio
da mangerioba torrando num caco
E o som do pilão transformando-a em pó.
Minhas manhãs têm o cheiro africano
Do mungunzá sobre a mesa e olhares famintos
Minhas manhãs têm o cheiro arábico
daquele café que coado naquele pano encardido
Minhas manhãs têm o cheiro nordestino
da tapioca, do cuscuz, do arroz doce, do bolo de macaxeira
da pamonha, da canjica, da cocada ...
Não são meras fragrâncias de comidas
São vidas; vidas que vivi e ainda vivo
Devorando-as como um menino
Como adulto faço a digestão
E no final adubo o mundo, na velhice, com a defecação.
(*) Quarenta (bolo típico de meu torrão)

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